Paternidade Biológica e Socioafetiva: direitos e deveres 

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Entenda as diferenças entre paternidade biológica e socioafetiva e veja como isso reflete na legislação.  

Introdução 

Quando o assunto é paternidade diante do contexto jurídico, é importante compreender que existem direitos e deveres a serem seguidos.

A paternidade é, sobretudo, um conceito que transcende o vínculo biológico, pois abrange também aspectos socioafetivos. Tanto a paternidade biológica quanto a socioafetiva são reconhecidas e protegidas pela legislação brasileira. 

Para facilitar o entendimento, estruturamos este texto com direitos e deveres inerentes a cada tipo de paternidade, destacando suas implicações legais e sociais.

Compreender o que diz a lei, acima de tudo é um acalento para pais com dúvidas, principalmente para pais adotivos que se sentem um pouco perdidos em relação aos seus direitos.

Entretanto, mesmo com diferenças conceituais, ser pai vai muito além da lei, envolve afeto, proteção e preocupação com o bem-estar das crianças

O que é Paternidade Biológica?

A paternidade biológica é a relação estabelecida entre um homem e uma criança baseada em vínculos genéticos. Esse tipo de paternidade reflete a conexão natural entre pai e filho, determinada pela herança do DNA. 

A paternidade biológica é reconhecida pela lei e tem implicações significativas em termos de direitos e deveres.

Como é estabelecida a paternidade biológica

Registro de Nascimento

O reconhecimento da paternidade biológica pode ocorrer de maneira espontânea no momento do registro de nascimento da criança. 

Quando o pai declara a paternidade voluntariamente no cartório de registro civil, seu nome é incluído na certidão de nascimento da criança. Esse ato formaliza a relação paterna e estabelece direitos e deveres legais.

Exames de DNA

Em casos, sobretudo, quando há dúvidas sobre a paternidade ou quando o pai não assume voluntariamente a paternidade biológica pode ser estabelecida por meio de exames de DNA. 

Esses testes são altamente precisos e confirmam ou excluem a relação biológica entre o homem e a criança com quase 100% de certeza.

Diante deste cenário, pode ocorrer uma solicitação judicial, na qual, o exame de DNA pode ser solicitado para investigação de paternidade. Todavia, a mãe ou a própria criança (representada por um responsável) pode entrar com o processo.

Então, o resultado do exame é utilizado pelo juiz para determinar a paternidade. Em caso de confirmação, o juiz pode ordenar a inclusão do nome do pai na certidão de nascimento da criança, além de definir os respectivos direitos e deveres como pai.

Direitos e deveres do pai biológico

De acordo com o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT):

É dever dos pais assistir, educar e criar os filhos menores, conforme dispõe o art. 229 da CF/88, regulamentado pelo Código Civil, que impõe a ambos os genitores o dever de sustentar, guardar e educar os filhos menores (art. 1.566, IV), bem como define ser obrigação do pai e da mãe arcar com a manutenção dos filhos na proporção da capacidade financeira de cada um (art. 1.703).” 

Da mesma forma, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) estabelece que os pais têm o dever de sustentar, guardar e educar seus filhos menores. 

Além disso, prevê a perda ou suspensão do poder familiar em casos de descumprimento injustificado dessas responsabilidades, sempre priorizando os interesses do menor em situações de conflitos.

Direito de Convivência 

O pai biológico tem o direito de conviver com seu filho, fortalecendo o vínculo afetivo. Portanto, a convivência regular é fundamental para o desenvolvimento emocional e psicológico da criança.

Direito de Guarda

Em situações de separação ou divórcio dos pais, o pai biológico pode pleitear a guarda compartilhada ou, em alguns casos, a guarda unilateral. 

A guarda compartilhada é incentivada pela legislação brasileira, pois promove a participação equilibrada de ambos os pais na criação do filho.

Direito de Visitação

Quando a guarda é atribuída à mãe, o pai biológico tem direito a um regime de visitas estabelecido por acordo entre os pais ou determinado pelo juiz. Esse direito visa, acima de tudo, assegurar a manutenção do vínculo paterno.

Além disso, o pai biológico tem o direito de participar das decisões importantes na vida da criança, incluindo aspectos relacionados à educação, saúde e bem-estar geral.

Deveres e obrigações 

Prover o sustento

O pai biológico é responsável por prover o sustento da criança. Isso inclui contribuir financeiramente para as necessidades básicas, como alimentação, vestuário, educação, saúde e moradia.

Logo, o não cumprimento desse dever pode resultar em ações judiciais de pensão alimentícia.

Dever de proteção

O pai biológico, contudo, deve zelar pela segurança e bem-estar do filho, garantindo que ele cresça em um ambiente seguro e saudável. Similarmente, isso inclui proteger a criança de situações de risco e tomar decisões que visem o seu bem-estar e melhor interesse.

Dever de afeição e cuidado

O pai biológico tem o dever de proporcionar afeto, atenção e cuidado emocional, estabelecendo uma relação de confiança e apoio com a criança.

Paternidade Biológica e Socioafetiva: direitos e deveres
Paternidade biológica e socioafetiva (Fonte: Freepik)

O que é paternidade socioafetiva?

A paternidade socioafetiva é quando alguém se torna pai ou mãe de uma criança por meio do amor e do cuidado diário, mesmo sem ter uma ligação genética. 

Em outras palavras, isso significa que um adulto que não é o pai biológico assume a responsabilidade de cuidar, educar e proteger a criança, assim como faria um pai biológico. Esse vínculo é criado por meio da convivência, do afeto e do compromisso com a criança.

Contudo, a paternidade socioafetiva é reconhecida e protegida pelo ordenamento jurídico brasileiro pelo Código Civil e pela Constituição Federal. 

Essa questão reflete a evolução do conceito de família e o reconhecimento da importância dos vínculos afetivos para o desenvolvimento da criança. 

Fundamentos Legais

O Código Civil de 2002 trouxe avanços significativos ao reconhecer e regulamentar a paternidade socioafetiva. O artigo 1.593, por exemplo, define a família como a união de pessoas com laços de afinidade e afetividade, ampliando a visão tradicional de família para incluir relações socioafetivas

Similarmente, o mesmo artigo e seus subsequentes tratam das relações familiares e incluem o conceito de família por afinidade, que também abrange a paternidade socioafetiva.

Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)

O ECA, em seu artigo 227, prioriza o melhor interesse da criança e do adolescente, o que inclui reconhecer e proteger os vínculos afetivos que contribuem para o bem-estar da criança. 

Isso se alinha ao conceito de paternidade socioafetiva, que visa garantir um ambiente familiar saudável e equilibrado.

Jurisprudência e Decisões Judiciais

Os tribunais brasileiros têm reconhecido a paternidade socioafetiva em diversas decisões, considerando a qualidade da relação afetiva e o papel desempenhado pelo indivíduo na vida da criança. Essas decisões demonstram uma interpretação moderna da legislação, acolhendo a paternidade socioafetiva como uma realidade das dinâmicas familiares contemporâneas.

Direitos e Deveres do Pai Socioafetivo

Similarmente ao pai biológico, a partir da ordenação jurídica, os pais socioafetivos passaram a ter os mesmos direitos e deveres, incluindo herança e pensão alimentícia. 

Isso significa que a legislação reconhece a importância e a validade dos laços afetivos na constituição da família e atribui a esses vínculos o mesmo peso legal que os vínculos biológicos.

Direito à Convivência

O pai socioafetivo tem o direito de manter um relacionamento contínuo e significativo com a criança, semelhante ao pai biológico. Esse direito é essencial para o desenvolvimento emocional e psicológico da criança.

Direito de guarda e visitação

Em casos de separação, divórcio ou disputa sobre a guarda, o pai socioafetivo pode pleitear a guarda compartilhada ou um regime de visitas, visando assegurar a continuidade da relação parental e o bem-estar da criança.

Direito à participação nas decisões

O pai socioafetivo tem o direito de participar das decisões importantes na vida da criança, incluindo questões relacionadas à educação, saúde e bem-estar.

Direito a herança 

No inventário extrajudicial (realizado diretamente no cartório), se houver consenso entre todos os herdeiros, o filho pode ser incluído sem maiores complicações.

Entretanto, se os demais herdeiros não reconhecerem esse filho e se recusarem a dividir a herança com ele, é possível solicitar o reconhecimento da paternidade socioafetiva mesmo após o falecimento do pai ou da mãe.

Para comprovar o vínculo, podem ser utilizadas testemunhas, mensagens, registros de planos de saúde, seguros e outros documentos que evidenciem a relação socioafetiva.

Deveres

Dever de sustento

Assim como o pai biológico, o pai socioafetivo tem a responsabilidade de contribuir para o sustento da criança, abrangendo necessidades básicas como alimentação, vestuário, educação e saúde.

Pensão Alimentícia

Pais socioafetivos também têm a obrigação de prover pensão alimentícia, caso necessário. Isso ocorre quando há uma necessidade financeira por parte do filho e a capacidade contributiva do pai/mãe socioafetivo(a). 

Da mesma forma, filhos têm o direito de solicitar pensão alimentícia dos pais socioafetivos, reforçando o princípio de que o cuidado e a responsabilidade não se limitam aos laços biológicos, mas se estendem aos vínculos afetivos estabelecidos.

Dever de educação

O pai socioafetivo deve participar ativamente na educação e orientação moral da criança, desempenhando um papel significativo em seu desenvolvimento.3

Dever de proteção

Acima de tudo, o pai socioafetivo deve garantir a segurança e o bem-estar da criança, protegendo-a de situações de risco e promovendo um ambiente saudável e estável.

Exemplos de situações que configuram paternidade socioafetiva

Adoção

A adoção é um dos exemplos mais claros de paternidade socioafetiva. Isto é, quando um adulto adota uma criança, ele assume todas as responsabilidades e direitos parentais, independentemente de qualquer relação genética. 

Sobretudo, a relação de afeto e cuidado que se desenvolve entre o adotante e a criança é a base da paternidade socioafetiva. Esse vínculo é reconhecido legalmente, conferindo ao adotante os mesmos direitos e deveres de um pai biológico.

Padrastos e Madrastas

Quando uma pessoa se casa com alguém que já tem filhos, ela pode desenvolver um vínculo profundo e significativo com essas crianças. 

Além disso, muitos padrastos e madrastas assumem participação ativa na criação, educação e cuidado dos enteados. Da mesma forma, muitas vezes têm funções parentais equivalentes às de um pai ou mãe biológicos.

Esse envolvimento contínuo e a criação de laços afetivos também caracterizam a paternidade socioafetiva.

Guarda de crianças por familiares

Em algumas situações, crianças são criadas por avós, tios ou outros parentes devido a diversas circunstâncias, como a ausência ou incapacidade dos pais biológicos. 

Então, esses familiares muitas vezes assumem todas as responsabilidades parentais, desde a provisão de necessidades básicas até o apoio emocional e educativo. 

Portanto, essa situação também configura paternidade socioafetiva, baseada nos laços de afeto e cuidado constante.

Famílias Homoafetivas

Em famílias homoafetivas, nas quais casais do mesmo sexo decidem criar filhos, a paternidade socioafetiva é um componente essencial.

Seja por meio da adoção, reprodução assistida (inseminação artificial) ou maternidade de substituição, ambos os parceiros assumem o papel de pais, desenvolvendo uma relação afetiva e parental com a criança, mesmo que apenas um dos cônjuges tenha uma conexão genética.

Reconhecimento legal da paternidade socioafetiva: como é feito

Os tribunais brasileiros têm reconhecido cada vez mais a paternidade socioafetiva, baseando-se no princípio do melhor interesse da criança. 

Decisões judiciais frequentemente têm conferido direitos e deveres a pessoas que, embora não tenham vínculo biológico com a criança, desempenham função parental significativa e constante.

Esse reconhecimento pode ser formalizado por meio de processos judiciais nos quais a paternidade socioafetiva é declarada. Além disso, também há casos em que pode ser feito o registro em cartório, desde que dentro dos requisitos estabelecidos pela justiça.

Registro em Cartório 

Desde 2017, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) permite o reconhecimento voluntário da paternidade socioafetiva diretamente nos cartórios de registro civil. 

Entretanto, o CNJ impede que o reconhecimento seja feito em cartório sem a manifestação da mãe e do pai biológicos.

Essa medida simplifica o processo, pois permite que indivíduos que criam e cuidam de uma criança como se fossem seus pais biológicos possam formalizar essa relação legalmente, sem a necessidade de um processo judicial. 

Para isso, é necessário que haja o consentimento de todos os envolvidos, incluindo a criança, se ela tiver idade suficiente para expressar sua vontade, conforme expresso no artigo 10 do Provimento Nº 83 de 14/08/2019:

O reconhecimento voluntário da paternidade ou da maternidade socioafetiva de pessoas acima de 12 anos será autorizado perante os oficiais de registro civil das pessoas naturais.

Documentos necessários para solicitar a paternidade socioafetiva

Para solicitar o reconhecimento da paternidade socioafetiva, primeiramente é necessário reunir uma série de documentos e seguir alguns procedimentos específicos. 

Entretanto, tudo vai depender se a solicitação será feita diretamente em cartório ou por meio de um processo judicial.

Geralmente, os documentos obrigatórios incluem os seguintes: 

  • Certidão de Nascimento da criança: original e cópia.

  • Documento de Identidade dos envolvidos: RG ou outro documento oficial com foto (original e cópia) do pai/mãe socioafetivo(a), da mãe/pai biológico(a) e, se aplicável, do pai biológico.

  • Comprovante de Residência: original e cópia.

  • Declaração de Consentimento: se a criança tiver idade suficiente para expressar sua vontade (geralmente a partir dos 12 anos), é necessário um documento no qual a criança manifesta seu consentimento para o reconhecimento da paternidade socioafetiva.

  • Consentimento do pai/mãe biológico (a), se não for um dos requerentes.

  • Declaração de Convivência: documento que atesta a convivência familiar e a relação de afeto existente entre a criança e o pai/mãe socioafetivo (a). Pode ser uma declaração assinada por testemunhas (amigos, familiares, vizinhos) que confirmem essa relação.

  • Provas da Relação Socioafetiva: fotografias, mensagens, testemunhos de amigos e familiares e qualquer outro tipo de evidência que comprove a convivência e o vínculo afetivo.

Esses documentos legais também servem como base para proteger os direitos das crianças em situações de paternidade socioafetiva.

Processo Judicial para Reconhecimento de Paternidade Socioafetiva

Quando o pedido for judicial, o primeiro passo é contratar um advogado especializado em direito de família. Outrossim, o advogado será responsável por orientar os envolvidos, preparar a petição inicial e representá-los durante todo o processo judicial.

Presença paterna e seu impacto no desenvolvimento infantil

Indiferente do tipo de paternidade, socioafetiva ou biológica, a presença paterna é um fator essencial no desenvolvimento infantil, pois influencia de maneira significativa o crescimento emocional, social e cognitivo da criança.

Conforme o Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM):

“[..] é indispensável que os pais estejam preparados emocionalmente para gerar, receber e criar seus filhos com capacidade para reconhecer e identificar as próprias emoções e sentimentos, pois desde a gestação todas as experiências vividas pela criança, farão para sempre parte dela”.

Pais que participam ativamente da vida de seus filhos oferecem suporte emocional, orientação e amor. 

Estudos comprovam que crianças que convivem com pais presentes apresentam melhores desempenhos acadêmicos, autoestima elevada e comportamentos sociais mais saudáveis. Além disso, podem reduzir consideravelmente os riscos de desenvolver ansiedade e depressão. 

Portanto, incentivar a participação ativa dos pais na criação e educação dos filhos é vital para o crescimento saudável da criança, além de contribuir para o desenvolvimento de uma sociedade mais equilibrada mentalmente. 

Conclusão

Assim como o pai biológico, o pai socioafetivo tem direitos e deveres similares, porém ambos com o mesmo propósito: manter um relacionamento significativo com a criança para promover bem-estar emocional e psicológico.

Apesar das diferenças na base legal e no processo de reconhecimento, os direitos dos pais biológicos e socioafetivos são amplamente semelhantes.

Todavia, a legislação brasileira reconhece e protege ambos os tipos de paternidade, garantindo que os laços afetivos sejam valorizados e que o melhor interesse da criança seja sempre prioridade.

Muitos tribunais brasileiros têm reconhecido a paternidade socioafetiva em diversas decisões, pois consideram a qualidade e a importância dessa relação na vida da criança. 

Por fim, essa comparação destaca, sobretudo, a evolução do conceito de paternidade e a importância do vínculo afetivo na formação familiar, promovendo uma abordagem inclusiva e justa para todas as formas de ser pai. 

Se você vive um conflito relacionado à paternidade, considere buscar ajuda profissional especializada. Conhecer seus direitos como pai ou filho, é um dos passos mais importantes para tomar decisões informadas e coerentes com a sua vida. 

Fonte:

Conselho Nacional de Justiça – CNJ
Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM)
JusBrasil

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